As interfaces das Relações Internacionais (RI) e os Estudos de Paz e Conflito
A partir de sua história profunda, os EPC foram moldados por visões enraizadas em observações do mundo natural e na compreensão do lugar dos seres humanos nele inseridos. Segundo Wolfgang Dietrich, muitas das palavras mais antigas para a paz estão enraizadas em uma visão universal enérgica que mantém a fertilidade como a principal fonte de paz e bem-estar. A compreensão da paz em muitas culturas tradicionais e outras tradições antigas mantém uma perspectiva de harmonia dinâmica entre o mundo natural e os seres humanos.
O advento dos EPC como um campo de estudo definido tem suas raízes no desafio que as Relações Internacionais (RI) enfrentam em abordar adequadamente os conflitos violentos. Muitas vezes - sem generalizar, é claro - abordagens baseadas em RI adotam uma perspectiva de conflito em que os seres humanos são considerados inerentemente violentos e os surtos de conflitos são inevitáveis. A partir disso, a eclosão de um conflito é uma crise que deve ser enfrentada por atores poderosos. Conflito deve ser controlado, gerenciado e impedido por meios políticos, mas é imposto pelo poder de infligir violência. Com base nesse pensamento realista, o Estado é o ator encarregado de lidar com os conflitos. Com o monopólio de infligir violência, o Estado gerencia conflitos internos e externos por meio do uso da força. Quando os conflitos ocorrem entre os Estados, eles são entendidos como disputas que precisam ser resolvidas. A paz global é mantida por um precário (e violento) equilíbrio de poder.
Abordagens orientadas por essa perspectiva são amplamente descritas como "gestão de conflitos", ou "solução de controvérsias", e tendem a se concentrar no conflito imediato e procurar limitar os danos causados pelo conflito. Presta-se atenção para desescalar o conflito antes que ele se transforme em violência direta por meios diplomáticos, políticos e, por fim, militares. Com esse foco em interromper a violência, lida-se pouco com as queixas subjacentes e as dinâmicas relacionais que causam e perpetuam o conflito. Essa perspectiva está subjacente a vários esforços de manutenção da paz e pacificação em todo o mundo e à lógica por trás da segurança nuclear.
A capacidade limitada dessas abordagens em prevenir conflitos e manter uma paz estável levou à articulação de uma abordagem baseada mais na solução de problemas. Subjacente a essa perspectiva estão as mudanças científicas e culturais da modernidade, que viam o mundo como inerentemente mecanicista, determinístico e, portanto, previsível. Assim, os conflitos não eram encarados como fenômenos a serem gerenciados, mas como problemas a serem compreendidos e resolvidos. Essas abordagens, amplamente definidas como "Resolução de Conflitos", começaram a enfatizar a análise das causas-raiz dos conflitos para além da violência direta e dos interesses declarados das partes envolvidas.
As abordagens de Relações Internacionais reconhecem que alguns conflitos não podem ser resolvidos lidando apenas com os interesses declarados dos envolvidos, particularmente quando os conflitos estão relacionados a necessidades humanas fundamentais, acesso a recursos e questões identitárias profundas. Uma paz estável e duradoura só pode ser alcançada atendendo às necessidades subjacentes dos vários interesses envolvidos em um conflito.
Além disso, uma abordagem de Resolução de Conflito baseia-se em percepções da psicoterapia e da teoria da comunicação. A relação entre necessidades, posições e interesses é importante na resolução de conflitos. As necessidades são fundamentais e não negociáveis, enquanto posições e interesses são áreas em que os grupos têm a capacidade de encontrar um terreno comum.
Nós, da Paz & Mente, optamos por focar nossos estudos acadêmicos na abordagem de Transformação de Conflitos. Nela, o mediador apenas acompanha os grupos a compreenderem melhor suas necessidades e como podem comunicá-las (no nível de corpo, fala e mente) de tal forma que todas as partes envolvidas nos sistema conflituoso possam encontrar um espaço comum para entender e desenvolver métodos que satisfaçam todas as necessidades. Nessa perspectiva de Transformação de Conflitos essa percepção é essencial para abordar o conflito.
Nas perspectivas convencionais, o mediador é visto como um terceiro de fora do conflito, neutro em relação ao resultado. No caso da transformação de conflitos, o mediador é parte do sistema e acompanha os processos para que as partes percebam além de seus interesses declarados e para que possam articular suas necessidades subjacentes com mais clareza para uma ressignificação de sua experiência, chegando a transformações mais palpáveis que atendam às necessidades das partes e não apenas a seus interesses. Na nossa abordagem, os conflitos são vistos como oportunidades, o ponto é como lidamos com eles e não os conflitos em si. Eles são partes da vida.
Por isso é que nosso programa de pós-graduação em Transformação de Conflitos e Estudos de Paz com ênfase no Equilíbrio Emocional oferece um laboratório para experimentar e partilhar conhecimentos e ferramentas para podermos lidar melhor com os conflitos. Focamos no trabalho do equilíbrio emocional do agente de paz pois, afinal, para que haja realmente uma transformação, é necessário mudança de cosmovisão e que todos estejam disponíveis e abertos a ressignificarem suas experiências, a se abrirem ao novo e com isso realizarem as pazes relacionais. Nosso programa tem a chancela da Cátedra de Estudos de Paz da UNESCO pela Universidade de Innsbruck, e reconhecimento do MEC com participação de 95% de facilitadores internacionais e nacionais com Ph.D. Para saber mais, acesse este link.